30
Mar 12
30
Mar 12

A MINHA ALDEIA

Homens, que trabalhais na minha aldeia,

Como as árvores, vós sois a Natureza.

E se vos falta, um dia, o caldo para a ceia

E tendes de emigrar,

Troncos desarreigados pelo vento,

Levais terra pegada ao coração.

 

E partis a chorar.

Que sofrimento,

Ó Pátria, ver crescer a tua solidão!

 

Teixeira de Pascoais

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29
Mar 12
29
Mar 12

"O oiro, o cobre e a prata"

O oiro, o cobre e a prata,

Que correm pelo mundo fora,

Servem sempre de arreata

Pra levar burros à nora.

 

António Aleixo

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28
Mar 12

SONETO PLUMÁRIO

No espaço a inquieta pluma rodopia,

rodopia no espaço a pluma inquieta.

Na haste, a gota de sangue da agonia

oscilante no espírito da queda.

 

O espaço é grande e azul demais para essa

pluma plainando solitária e fria

sob o teto de abril, a coisa aérea,

leve, levada pela ventania

 

para o chão, aproxima-se suave,

nota de canto, ainda um pouco de ave,

quando afinal termina o giro e pousa,

 

vê-se que a pluma exânime, caída,

era música e sal, era o gemido

migrante da asa e a lágrima do voo.

 

Mauro Mota

publicado por RAA às 14:45 | comentar | favorito
28
Mar 12

ONDAS

Onde -- ondas -- mais belos cavalos

Do que estes ondas que vós sois

Onde mais bela curva do pescoço

Onde mais longas crinas sacudidas

Ou impetuoso arfar no mar imenso

Onde tão ébrio amor em vasta praia.

 

Dezembro 89

 

 

Sophia de Mello Breyner Andresen

 

 

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27
Mar 12
27
Mar 12

"A praça tem uma torre"

A praça tem uma torre,

a torre tem um balcão,

o balcão tem uma dama,

a dama uma branca flor.

Passou lá um cavaleiro

-- quem sabe porque passou! --

e levou consigo a praça

com sua torre e seu balcão,

com seu balcão, sua dama,

sua dama e sua branca flor.

 

Antonio Machado

 

(Jorge de Sena)

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26
Mar 12

INTANGÍVEL

No voo em que me enlevo a procurar-te,

Mergulho no infinito, e até parece

Que um murmúrio de cântico e de prece

Me embala e vai comigo a toda a parte...

 

E toda a sombra má desaparece,

E toda a luz é para iluminar-te,

A música de Deus para cantar-te,

Por ti se enflora a terra e o sol aquece...

 

Por ti, que enches o mundo e não te vejo,

Onda incorpórea e hálito disperso,

Nuvem de fogo e sonho de desejo!

 

Por ti, que diluída no universo,

És o dulçor que encontro em cada beijo,

A harmonia que busco em cada verso!...

 

Cândido Guerreiro

publicado por RAA às 14:37 | comentar | favorito

SOLEIL COUCHANT

Les ajoncs éclatants, parure de granit,

Dorent l'âpre sommet que le couchant allume;

Au loin, brillante encor par sa barre d'écume,

La mer sans fin recommence où la terre finit.

 

À mes pieds c'est la nuit, le silence. Le nid

Se tait, l'homme est rentrée sous le chaume qui fume;

Seul, l'Angélus du soir, ébranlé dans la brume,

À la vaste rumeur de l´Océan s'unit.

 

Alors, comme du fond d'un abîme, des traînes,

Des landes, des ravins, montent de voix lointaines

De pâtres attardés ramenant le bétail.

 

L'horizon tout entier s'enveloppe dans l'ombre,

Et le soleil mourant, sur un ciel riche et sombre,

Ferme les branches d'or de son rouge éventail.

 

José Maria de Heredia

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26
Mar 12

"Desta perda geral, mágoa comua"

Desta perda geral, mágoa comua

A Sua Majestade dar queria

Um pêsame que fora uma alegria

A ser de minha sogra e não da sua.

 

Se à minha não há morte que a conclua,

À sua crer devemos com fé pia,

Que vestida e calçada ao Céu iria,

Como a minha ao Inferno, nua e crua.

 

E pois, ainda que pobre, eu também entro

Na mágoa universal desta senhora

Que tenho impressa d'alma bem no centro;

 

Estimara que el-Rei fizesse agora

Com que este dó, que trago cá por dentro,

Também se me enxergasse cá por fora.

 

Tomás Pinto Brandão

publicado por RAA às 00:33 | comentar | favorito
25
Mar 12
25
Mar 12

Aldeias Portuguesas

autor: Gustavo de Matos Sequeira
título: Aldeias Portuguesas
editora: Secretariado da Propaganda Nacional
local: Lisboa
ano: 1939
págs.: [24]
dimensões: 21x19x0,7 cm. (brochado)
ilustrações: Paulo
impressão: Oficina Gráfica, Lisboa
tiragem: 2000
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24
Mar 12
24
Mar 12

PEDRA DA ROSETA

chego sempre tarde

e fico nos bicos dos pés

atrás dos outros

          chamo-lhe dignidade

minha mãe diz que é falta de jeito

meu pai estupidez

as mulheres fogem desta tristeza

          dolorosa de ser sombra

será que vou perder nesta nostalgia de

          nunca ser sol

          o sonho americano?

 

Já Champollion

          ao decifrar

          a Pedra da Roseta

          leu o mesmo nos hieróglifos

          "Merde!

          Je suis foutue..."

 

Miguel Barbosa

publicado por RAA às 01:29 | comentar | favorito