12
Ago 12
12
Ago 12

A UM PIRILAMPO

A chuva não apaga o teu fulgor,

        o vento aumenta o teu ardor.

Porque não voas para o céu distante

        e és, ao luar, um estrela cintilante?

 

Li Bai

(António Graça de Abreu) 

publicado por RAA às 03:56 | comentar | favorito
10
Ago 12
10
Ago 12

CANTIGA DA AMAZONIA

NEM O MISTERIO DOS RIOS SE RENOVANDO,

NEM LA TERRA NINA NASCENDO A CADA MOMENTO NO PRINCIPIO DO MUNDO DA [AMAZONIA,

NEM O PITORESCO DOS LIRICOS NAVIOS ATRAZADOS,

NEM A FLORESTA DE TODAS AS ALUCINAÇÕES,

NEM O PAGÉ, O BOTO, A COBRA GRANDE,

NEM MESMO OS CABELOS DA ULTIMA YARA, DE OCULOS AZUES, VOGANDO NO RIO [DE MISTERIO EM LANCHA-AUTOMOVEL,

TÃO POUCO EL DOLOR E LA SANGRE DE LOS INDIOS DE RIVERA,

DOS CEARENCES DE FERREIRA DE CASTRO,

NENHUM MOTIVO ETERNO NA MINHA CANTIGA DO AMAZONAS.

 

APENAS O LOUVOR DO AMIGO:

O CIVILIZADO QUE PAROU NA SELVA,

FILHO DAS GLORIAS DUMA RAÇA FORTE,

MÃOS CHEIAS DE CULTURA E DE BOM GOSTO,

AQUELE PARA QUEM A HUMANIDADE NÃO É UMA PALAVRA VÃ,

GRANDE DA BONDADE,

 

PORTUGUEZ!

 

A CERTEZA DE PODER DIZER NA HORA DA MAIS DENSA ANGUSTIA:

EMIDIO VAZ D'OLIVEIRA, AMIGO,

AMIGO!

 

Jorge Amado

publicado por RAA às 14:24 | comentar | favorito
08
Ago 12
08
Ago 12

INSCRIÇÃO

Eu vi a luz em um país perdido.

A minha alma é lânguida e inerme.

Oh! Quem pudesse deslizar seu ruído!

No chão sumir-se, como faz um verme...

 

Camilo Pessanha

publicado por RAA às 02:41 | comentar | favorito
07
Ago 12
07
Ago 12

SONETO

Num veleiro chegou aquele dia

Do teu adeus e lágrimas no cais

De há muitos anos: Sim, há muitos mais,

-- Quando, talvez, nem mesmo cais havia...

Tu eras minha, lembras-te? e chovia;

Mas não em nós: somente sobre o arrais

De oleado vestido... vendavais

Uma aragem do norte prometia.

Que nuvem tão cerrada de gaivotas

Tanto tempo de ti me separou!

Que alegria que foi as velas rotas

Quando perto do porto a nau parou!

Que estranhas e fantásticas derrotas

Alguém, batendo à porta, malogrou!

 

Carlos Queirós

publicado por RAA às 03:18 | comentar | favorito
05
Ago 12
05
Ago 12

DETECTIVE STORY

Who is ever quite without his landscape,

The straggling village street, the house in trees,

All near the church? Or else, the gloomy town-house,

The one with the Corinthian pillars, or

The tiny workmanlike flat, in any case

A home, a centre where the three or four things

That happen to a man do happen?

Who cannot draw the map of his life, shade in

The country station where he meets his loves

And says good-bye, continually, mark the spot

Where the body of his happiness was first discovered?

 

An unknown tramp? A magnate? An enigma always,

With a well-buried past: and when the truth,

The truth about our hapiness comes out,

How much it owed to blakmail and philandering.

 

What follows is habitual. Al goes to plan:

The feud between the local common sense

And intuition, that exasperating amateur

Who's always on the spot by chance before us;

All goes to plan, both lying and confession,

Down to the thrilling final chase, the kill.

 

Yet, on the last page, a lingering doubt:

The verdict, was it just? The judge's nerves,

That clue, that protestation from the gallows,

And our own smile... why, yes...

 

But time is always guilty. Someone must pay for

Our loss of happiness, our happiness itself.

 

W. H. Auden 

publicado por RAA às 15:42 | comentar | favorito
03
Ago 12
03
Ago 12

DEUS NÃO É FANTOCHE... SENÃO EXISTIA

não conheço maior ficção que a vida

e mesmo quando ela acaba, continuamos a ficcionar:

ficcionámos tanto desde a invenção da escrita, que criámos

inúmeros deuses à medida das posses de cada um.

adoro sobretudo o elefante: garante-me paz, protecção e

memória de cemitério. um deus só, sabe-me a pouco e torna-se

demasiado monótono, monogâmico, monocórdico, chato pronto

-- daí dizer-se religião monoteísta, além domoneyenvolvido,

claro, acresce essa carga fascista.

 

Dinis H. G. Nunes

publicado por RAA às 17:37 | comentar | favorito
02
Ago 12
02
Ago 12

OS MORTOS PERGUNTAM

Nos rumos perdidos dos ventos trocados

       Todos os rumos,

Nos fumos das piras dos mortos cremados

Todos os fumos,

de todas as piras...

Nas iras dos mares

Que beberam sangue

Todas as iras...

Na ânsia enlutada de todos os lares

       Vazios de esperança

Todas as ânsias

De todos os lares...

Nos sexos sangrentos das virgens violadas

Os farrapos

a sangrar

De todos os sonhos que homens sonharam

E homens violaram...

Em todas as dores dos vivos da terra

       todas as dores dos mortos da guerra...

E os rumos perdidos

e os corpos ardidos,

e as iras inúteis,

e as ânsias caladas,

E os sonhos, sujos como vidas de virgens violadas

E todas as dores

de todos os mortos que a guerra matou,

e todos os lutos

de todos os vivos

que a guerra enlutou,

       Perguntam,

perguntam,

perguntam

a todos os ventos

a todos os mares

às roupas de luto de todos os lares,

Se valeu a pena...

...Os mortos perguntam...

Mas os ventos trocam-se,

o mar não serena

as viúvas continuam a chorar,

e os mortos não páram de perguntar

se valeu a pena...

...Mas a esperança é longa

e bela de agarrar no fundo dos martírios...

Os mortos perguntam,

os mortos protestam...

...Irmãos, os braços são magros,

mas longos,

Longos da ânsia de querer...

...A pergunta é grande e a força é pequena,

mas nós só podemos, Irmãos, responder,

Se valeu a pena...

 

 

António Neto

 

publicado por RAA às 17:11 | comentar | favorito
01
Ago 12
01
Ago 12

MISTERIO GOZOSO

Perdóname labio porque no te pertenezco,

esta plegaria la dicta su lugar hueco.

Mis manos me llevan a sitios prohibidos,

enredando las sábanas, pensándote a solas

como un perro lazarillo bien adiestrado.

 

Porque es tan casto este ardor

que mi boca peca de ser aún doncella

y llaga mi lengua cada vez que te besa.

Ah, la hiel de tu silencio distante e indefinido

me ha convertido en una virgen impura.

 

Cecilia Quílez

publicado por RAA às 12:43 | comentar | ver comentários (2) | favorito