28
Set 15
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Set 15

NATUREZA MORTA

O amarelo bondoso

das maçãs

alastrava ao prato de faiança

 

por cima, o embaraço fálico

de duas bananas estrangeiras

 

ao lado, umas uvas tardias

escorregavam lassas

entre os dedos

 

uma nódoa negra

tinha tocado podre

uma descuidada e solitária pêra rocha

 

e coroando o prato

o riso eufórico

de cinco belíssimas laranjas!

 

Um ramo de hortelã

ainda verde

num púcaro transparente

perfumava o ar

 

Enquanto para lá do vidro da janela

o sol outonal, desprevenido

persistia em brilhar.

 

Ângela Leite, As Horas de Penélope

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13
Set 15
13
Set 15

VENDO A MORTE

Em todo o lado vejo a morte! E, assim, ao ver

Que a vida já vem morta cruelmente

Logo ao surgir, começo a compreender

Como a vida se vive inùtilmente...

 

Debalde (como um náufrago que sente,

Vendo a morte, mais fúria de viver)

Estendo os olhos mais àvidamente

E as mãos p'ra a vida... e ponho-me a morrer.

 

A morte! sempre a morte! em tudo a vejo,

Tudo ma lembra! E invade-me o desejo

De viver toda a vida que perdi...

 

E não me assusta a morte! Só me assusta

Ter tido tanta fé na vida injusta

...E não saber sequer p'ra que a vivi!

 

Manuel Laranjeira, Comigo (1912)

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