28
Set 15

NATUREZA MORTA

O amarelo bondoso

das maçãs

alastrava ao prato de faiança

 

por cima, o embaraço fálico

de duas bananas estrangeiras

 

ao lado, umas uvas tardias

escorregavam lassas

entre os dedos

 

uma nódoa negra

tinha tocado podre

uma descuidada e solitária pêra rocha

 

e coroando o prato

o riso eufórico

de cinco belíssimas laranjas!

 

Um ramo de hortelã

ainda verde

num púcaro transparente

perfumava o ar

 

Enquanto para lá do vidro da janela

o sol outonal, desprevenido

persistia em brilhar.

 

Ângela Leite, As Horas de Penélope

publicado por RAA às 13:49 | comentar | ver comentários (1) | favorito
28
Abr 15

"Eu tinha sono."

Eu tinha sono.

A Sabedoria disse-me: "As rosas da Felicidade nunca perfumam o sono.

Em vez de abandonares a esse irmão da Morte,

bebe vinho. Tens a eternidade toda para dormir."

 

Omar Khayyam, Odes ao Vinho

(versão de Fernando Castro)

publicado por RAA às 23:53 | comentar | ver comentários (2) | favorito (1)
03
Nov 14

"Ninguém pode compreender o que é misterioso"

Ninguém pode compreender o que é misterioso.

Ninguém é capaz de ver o que ocultam as aparências.

As nossas moradas são privisórias, excepto uma: a terra.

Bebe vinho! Basta de palavras supérfluas.

 

Omar Khayyam, Rubayat

(versão de Fernando Castro)

publicado por RAA às 13:43 | comentar | favorito
03
Jul 14

FRUTOS

Pêssegos, pêras, laranjas,

morangos, cerejas, figos,

maçãs, melão, melancia,

ó música de meus sentidos,

pura delícia da língua;

deixai-me agora falar

do fruto que me fascina,

pelo sabor, pela cor,

pelo aroma das sílabas:

tangerina, tangerina.

 

Eugénio de Andrade,

Poetas de Hoje e de Ontem --

do Século XIII ao XXI, para os mais novos

(Maria de Lourdes Varanda & Maria Manuela Santos)

publicado por RAA às 18:58 | comentar | ver comentários (2) | favorito
19
Jun 14

"Na Primavera, gosto de me sentar na orla de um campo florido."

Na Primavera, gosto de me sentar na orla de um campo florido.

E, quando uma bela rapariga me traz uma taça de vinho,

não me importa nada a minha salvação.

Se eu tivesse essa preocupação, valeria menos que um cão.

 

Omar Khayyam, Odes ao Vinho

(versão de Fernando Castro)

publicado por RAA às 13:44 | comentar | ver comentários (1) | favorito
04
Fev 14

"Café"

Café

 

 

Espiral de energia

 

 

Explosão deliciosa

Do prazer

 

Yevre-le-Châtel

26 de Junho 90

 

Alberto de Lacerda,

Átrio

publicado por RAA às 13:49 | comentar | favorito
31
Jan 14

"Já nada me interessa."

Já nada me interessa. Levanta-te e dá-me o vinho!

Esta noite, a tua boca é a mais bela rosa do universo...

Vinho! Que ele seja rubro como as tuas faces

e os meus remorsos tão leves como os anéis da tua cabeleira.

 

Omar Khayyam, Rubayat

(trad., Fernando Castro)

publicado por RAA às 13:35 | comentar | favorito
04
Dez 13

O RAPAZ DO TRAPÉZIO VOADOR

O rapaz do trapézio voador

chegou à cidade numa tarde de grande calor

entrou num café pediu um licor

 

pediu outro e outro ainda

ao todo sete licores

cada um da sua cor

cada qual da cor mais linda

 

ao sétimo licor

sentiu uma dor

teve um sorriso amarelo

que ninguém aplaudiu

deu três voltas e caiu.

 

António José Forte,

in Maria de Lourdes Varanda e Maria Manuela Santos,

Poetas de Hoje e de Ontem

-- do Século XIII ao XXI para os Mais Novos

publicado por RAA às 13:37 | comentar | ver comentários (2) | favorito
24
Mai 12

RESPONDE AO QUE DISSE HAS DAMAS QUE SOSPIRAUAM POR PERAS, & MELÃO, & FIGOS [O CUYDAR, & SOSPIRAR]

   Sofpyrar por fygos, peras,

por melão, bolo folhado,

nam he sospirar deueras,

q doutras fruytas mais feras

vem o fofpirar formado.

Falem' do fofpirar

que vyr de payxões sentenda,

que o al mays he cuydar

aa vontade do paadar

peraas coufas damerenda.

 

Fernão da Silveira

publicado por RAA às 12:56 | comentar | favorito
02
Dez 11

CAIXA DE AMÊNDOAS

Ireis, amêndoas, saber

Que incomparável ventura

Às vezes há em sofrer.

 

Na boca vermelha e pura

Onde vos ides perder,

Se vos atrai certa alvura,

Muito deveis padecer.

 

Desta espantosa tortura

Só vos podeis defender

Duma maneira segura,

Dando-lhe o gozo e a doçura

De vos sentir derreter.

 

João Saraiva

publicado por RAA às 12:32 | comentar | favorito