19
Out 12

"Ah, a noite que eu, sem fim, passei..."

Ah, a noite que eu, sem fim, passei...

O Tempo alargava a sua duração

E dava-lhe o cerne do que na vida amei.

Comentaram alguns, pela noite fora,

Como se ia escoando a sua mansidão.

Mas a noite somente consentia a aurora...

 

Das nuvens tão denso era o breu

Que já não se sabia o que era Terra ou Céu.

Ao longe o raio entre trevas se escondia:

Era um negro que entre lágrimas sorria.

 

Brandi alto o sabre da minha vontade

E tingi o manto dessa mesma aurora

Ao ferir o colo da escuridade

Com o sangue da noite, pela noite fora.

 

Ibn Sara

(Adalberto Alves)

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23
Jul 12

"És tão lesto a escutar"

És tão lesto a escutar

Quem para as festas te convida...

Não vês cãs a segredar

Que a morte te leva a vida?

 

Deu-te Deus sabedoria,

Porque ignoras do Destino

Cego e surdo como um muro?

És e foste, isso é o Futuro.

 

Das esferas a harmonia

Findará em desatino:

Morrerão o Sol e a Lua

E a própria terra que é tua.

 

E na choça da carência

Ou na mansão da cidade

Todos perdem na verdade

Sua fugaz existência.

 

Ibn Sara

 

(Adalberto Alves)

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23
Mai 12

"Cai a noite."

Cai a noite.

     Sob o manto da sombra

     O braseiro é um bálsamo

     Que sara o aguilhoar

     Dos escorpiões do frio.

     Ardente, talhou as mantas,

     O nosso cálido abrigo

     Onde frio se não consente.

 

O incêndio na lareira

(Nós olhando fascinados

E a grande taça de vinho

Que vai passando em redor)

Mal nos permite a intimidade

E logo nos afasta.

 

É uma mãe,

     Que umas vezes nos amamenta

     E outra nos retira o peito.

 

Ibn Sara

(Adalberto Alves)

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19
Abr 12

SERRA NEVADA

Podeis esquecer a oração

E provar do vinho proibido:

Antes o fogo cruel da danação,

Menos atroz que a Serra Nevada,

Pois consola o pecador arrependido;

Antes as fornalhas do Inferno

Que o agreste de uma tal nortada.

Sem vã soberba daquilo que vos digo

Repetirei o dito do poeta antigo:

Se um dia cair nas penas do Inferno

Isso para mim será quase nada

Desde que aconteça em frio Inverno.

 

Ibn Sara

 

(Adalberto Alves)

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09
Mar 12

...

Honram, por ignorância, o mundo

Os homens, nesta desprezível vida;

Por ele se combatem como cães, que a fundo

Se atiram sobre caça ferida.

 

Ibn Sara

 

(Adalberto Alves)

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09
Fev 12

UM AMOR CASTO

Quantas vezes a amada me veio ver,

Negra era a noite como o seu cabelo.

Junto a mim até ao romper da alva

Tão refulgente como o seu rosto claro.

 

Ficou à minha mesa.

E o nosso puro amor

Serviu de companhia.

 

O vinho turbava a minha alma

Tal como as meninas dos seus olhos.

Mas permaneci casto,

Homem senhor da sua força:

Só tem virtude verdadeira

Quem a si se vence no vigor.

 

Ibn Sara

 

(Adalberto Alves)

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11
Jan 12

...

Os viajantes da noite murmuram o teu nome

E as areias do deserto derramam sobre quem te pisa

O perfume do almíscar.

E na formusura da invocação sabemos da beleza do invocado

Como pelo verdor das margens se pressente o rio.

 

Ibn Sara

 

(Adalberto Alves)

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14
Dez 11

A LAREIRA

Filha da perderneira

Tem brasas nas entranhas,

Estrelas brilhantes em noite escura.

 

Diz-me lá se na verdade

Ela não é alquimista?

Fundiu carvão em lingotes de ouro

De alva prata marchetados.

 

Se o sopro solta o silvo

Ela dança em rubra túnica.

E ao fundir a sua acha

Nesse ouro em lingotes

A aurora simulou

Quando a noite já caía.

 

Se em seu redor tu nos visses

Certamente que dirias:

Ei-los que ali estão bebendo

E passando em seu redor,

De um vermelho alaranjado,

Taças de espesso licor.

 

Ibn Sara

 

(Adalberto Alves)

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21
Nov 11

A BRISA E A CHUVA

Buscas consolo no sopro do vento?

Em sua aragem há perfume e almíscar

Que até ti vem, ataviado de aromas,

Fiel mensageiro da tua doce amada.

 

O ar prova os trajes das nuvens

E escolhe um manto negro.

Uma nuvem prenhe de chuva

Acena ao jardim, saúda-o

Vertendo lágrimas nas risonhas flores.

 

A Terra apressa a nuvem

Para que lhe acabe o manto.

E a nuvem com uma mão

Entretece fios de chuva

E com a outra vai-o enfeitando

Com um bordado a flores.

 

Ibn Sara

(Adalberto Alves)

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17
Fev 11

...

Às portas do céu
Um demo espiava.
Uma estrela se deu
Feita sacrifício.
Sobre ele lançou
Um rastro brilhante
De prata e de ouro,
Como um cavaleiro
Que ao galopar
O seu turbante
Viu se desatar
E para trás deixou
Um véu a pairar.

Ibn Sara

(Adalberto Alves)
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