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Dez 10

CANÇÃO SOBRE UM ETERNO MOTIVO

ao MANUEL MENDES

Sentado à minha varanda,
Contemplo a noite que desce
E a rosa
Que puseste no meu peito.

E, largo tempo,
Ficando silencioso,
Oiço uma voz que me fala...

-- Que voz é esta,
Tão incisiva, tão pura,
Que me pede que acredite
E tenha fé no destino?

Inclino a fronte, -- medito
No altíssimo desejo 
Que anda comigo
E sobe a cada momento!

Nas ramas do arvoredo,
O vento,
Passando, diz qualquer coisa.

A sombra cai,
De repente, volumosa.

Mal distingo as minhas mãos.

E ao pé de mim
Tomba o corpo
Fino e frágil dessa rosa...

          Londres,
          Março 1927


António Botto
publicado por RAA às 21:12 | comentar | ver comentários (2) | favorito

AS MÃOS

vivia tão só
que se consolava
esfregando longa longamente as mãos
          uma na outra
como se fossem dois amantes
          se consolando

Miguel Barbosa
publicado por RAA às 15:56 | comentar | favorito
31
Dez 10

PERSONAGEM E AVE NOS JARDINS DE SERRALVES

-- Senhora professora
já viu acolá um pato preto
e branco?
-- Já vi, sim, filho! São
como as pessoas que também podem
ser pretas e
brancas.
-- Mas eu nunca vi nenhuma
pessoa preta e
branca!
-- Não te estou a perceber, filho!

Meu belo navio negro
ave da minha memória
canção dolente canção.

João Miguel Fernandes Jorge
publicado por RAA às 10:51 | comentar | favorito