08
Fev 11

...

A corda tensa que eu sou,
o Senhor Deus é quem
a faz vibrar...

Ai linda longa melodia imensa!...
-- Por mim os dedos passa Deus     e então
já sou menos Som     e não
se sabe mais da corda tensa...

Sebastião da Gama
publicado por RAA às 23:58 | comentar | favorito

A ÚLTIMA ESPERANÇA

Chivera
naquela manhã viera
trazer o filho que morria
no armazém do patrão
para receber a guia
do lactário que dá injecção.

Disseram-lhe
que ele não podia
ser dispensado do serviço
só porque o filho tinha feitiço
e não comia há dois dias!

Na outra manhã
Chivera
já não trazia o
filho que morria
mas sim os olhos chorando
a boca muda protestando
a última esperança perdida;

só os sacos de milho
das lavras dos seus irmãos
no armazém esperavam
a hora das suas mãos
para mais um dia de vida...

Carlos Gouveia
publicado por RAA às 16:49 | comentar | favorito

PARAGEM

Estou numa encruzilhada.

Tenho um caminho na frente,
E os meus dois braços abertos
Indicam mais dois caminhos.

Se eu soubesse qual dos três
Caminhos é o meu caminho!

Talvez o que vem bater
No meu peito e nos meus olhos...

Talvez aquele que vem
Apertar a minha mão...

Talvez o outro, -- quem sabe?

Dentro de mim, uma voz
Diz-me que só um caminho
Merecerá os meus passos.

Não me diz, porém, qual é.

E, para não perder tempo,
E dar passos escusados
Deixo o tempo ir passando...

Alberto de Serpa
publicado por RAA às 14:16 | comentar | ver comentários (4) | favorito
08
Fev 11

POÉTICA

Poderia dizer que sou um Deus;
que as estrêlas aureolam a minha cabeça imaginativa;
que a todo o instante posso criar
tantos mundos ao sabor dos meus desejos.

Poderia dizer que sou um Deus;
que um gesto meu é capaz de multiplicar os pães
que as multidões mastigarão sofregamente;
que todos os homens vêm para a adoração do meu poder ilimitado.

Poderia dizer que sou um Deus;
que faço surgir nos desertos os trigais ondulantes;
que uma simples palavra minha provoca a fraternidade
entre os homens que se abraçam com um sorriso no rosto.

Mas sou, como os outros, telúrico e humano,
uso o silêncio da galocha, grito,
trabalho e sinto fome, oceânico e lúbrico,
ando com a barba por fazer.

Aluízio Medeiros
publicado por RAA às 11:48 | comentar | favorito