16
Mar 11

PRÓLOGO

O tempo, esse pequeno escultor,
prolongou-te os gestos
até à exaustão, ao limite do escárnio,
ao inoportuno reclame daquele
que vai morrer e não morre
e fala demasiado sobre o silêncio do seu grito.

Paciência. Não poderia ter sido de outra
maneira. Há uma infância parada,
onde o cadáver de deus
nada quer dizer. Sim, tem chovido muito.
Mas que saberá destas mesmas horas
o gato negro que a tua mão já não encontra?

Deténs-te, usas palavras vãs, despedes-te.
Sabes que foi sempre assim.

Manuel de Freitas
publicado por RAA às 23:58 | comentar | favorito

5 DIAS PARA MORRER

                                                                       para hector babenco

morreremos loucos, Ana

os sapatos
novos
em cima da mala
-- mala notte
o dia, a pior
foto: olhos úmidos
no vídeo
flashbacks:
a virilha imunda
do marinheiro
os eletrodos frios
nas têmporas
as pílulas coloridas
peixes
num aquário
cujo vidro
quase se quebra
toda vez
que o tocamos

sim, Ana
morreremos loucos
mas
esta noite
dormiremos
juntos

Ademir Assunção
publicado por RAA às 14:24 | comentar | favorito

franja

A franja esconde
-te os olhos grandes.
O vestido justo molda
-te as coxas exuberantes,
tão descaradas como
os teus grandes olhos
escondidos pela franja.
VI-2003
publicado por RAA às 11:29 | comentar | favorito
16
Mar 11

Velha entrevada

Aquele que não conhece a doença
nem o progresso nem o desfecho dela
mal saberá que mal alumiado
poço de angústias é uma velha entrevada
disposta em cama de palha
que não lhe retarda -- antes fomenta --
a podridão,

na esperança e no terror
de que tudo acabe em breve.

A. M. Pires Cabral
publicado por RAA às 10:58 | comentar | favorito