25
Set 11
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Set 11

O SOL É UM COMETA

Um astro rápido atravessa a água
do céu de maio não como um destroço
das primaveras que o passado esmaga
é um leão que treme na luz de ouro

O sol é um cometa quando o vejo
com os músculos de ouro do meio-dia
dilacerar a água que o protege
tal como o corpo dilacera a vida

Gastão Cruz
publicado por RAA às 23:16 | comentar | ver comentários (2) | favorito
24
Set 11
24
Set 11

EVA

A culpa toda
me reveste
e eu nua.

Ouvi o que
a serpente
sussurrava
e caí.
Com Adão.

Nos desterrou
o anjo.
Era o conhecimento
de um pudor
ou soluço.

O que pode
a dor,
se nenhum traço
nos julga?

Com medo,
escondo a face.
E opaco, nulo
o riso. Tudo
é desconhecido
fora do paraíso.

Carlos Nejar 
publicado por RAA às 21:27 | comentar | favorito
23
Set 11
23
Set 11

...

A vida de tudo quanto vive
          é penhor do Nada.
O mundo que agora une
          é o que amanhã apartará.
A vida dá-nos o Hoje para nos aproximar
          e a Eternidade para a separação.
Possui acaso o rei o mistério da morte?
O seu poder contraria o transe do destino?
Não é isso que vejo!
A morte desfaz o que a união congrega:
Ó colinas vestidas de evanescentes mantos
Ó vida aniquiladas com brutal furor
Ó almas atingidas de insanável mal,
Não sabeis que suas mãos profanam os haréns,
Os mais nobres príncipes e as suas damas?
Que ela é o mal que abate o monarca
Com golpe fero que atrai a compaixão?
Que contra ela os elementos não são armas
Nem as lágrimas lhe dão sequer remédio?
Logro contra ela é o recurso dos suspiros!
Logro contra ela é o socorro do pranto!
Como pôr fim a um mal com outro mal?
Como tratar a dor com outra dor?

Ibn Darraj al-Qastalli

(Adalberto Alves)
publicado por RAA às 12:01 | comentar | favorito
22
Set 11

...

A poesia é o "real absoluto" mas em constante mutação, e por isso sempre haverá poesia que sempre se cumprirá fora dos muros e das luzes da cidade. É este o lugar dos poetas, cá fora. Os que se aproximam dos outros poderes ou perderam a inocência ou nada aprenderam com a experiência: já não são poetas.

Casimiro de Brito
publicado por RAA às 19:41 | comentar | favorito
22
Set 11

...

Tal como Gramsci e a sua mãe, o único Paraíso que concebo situa-se no coração dos meus.
publicado por RAA às 10:33 | comentar | favorito
21
Set 11
21
Set 11

BARCOS DE PAPEL

Quando a chuva cessava e um vento fino
franzia a tarde tímida e lavada,
eu saía a brincar pela calçada,
nos meus tempos felizes de menino.

Fazia de papel toda uma armada
e, estendendo meu braço pequenino,
eu soltava os barquinhos, sem destino,
ao longo das sarjetas, na enxurrada...

Fiquei moço. E hoje sei, pensando neles,
que não são barcos de ouro os meus ideais:
são feitos de papel, tal como aqueles,

perfeitamente, exatamente iguais...
-- que os meus barquinhos, lá se foram eles!
foram-se embora e não voltaram mais!

Guilherme de Almeida
publicado por RAA às 14:14 | comentar | favorito
20
Set 11

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O crítico tem alma de camelo:
frutas e flores, eis o que el' não come.
No florido jardim do doce néctar,
se não vê espinhos, morrerá de fome.

poema sânscrito anónimo

(Jorge de Sena)
publicado por RAA às 14:30 | comentar | favorito
20
Set 11

CANÇÃO DE SALABU

Nosso filho caçula
Mandaram-no p'ra S. Tomé
Não tinha documentos
          Aiué!
Nosso filho chorou
Mamã enlouqueceu
          Aiué!
Mandaram-no p'ra S. Tomé

Nosso filho já partiu
Partiu no porão deles
          Aiué!
Mandaram-no p'ra S. Tomé

Cortaram-lhe os cabelos
Não puderam amarrá-lo
          Aiué!
Mandaram-no p'ra S. Tomé

Nosso filho está a pensar
Na sua terra, na sua casa
Mandaram-no trabalhar
Estão a mirá-lo, a mirá-lo

-- Mamã ele há-de voltar
Ah! A nossa sorte há-de virar
          Aiué!
Mandaram-no p'ra S. Tomé

Nosso filho não voltou
A morte levou-o
          Aiué!
Mandaram-no p'ra S. Tomé!

Mário Pinto de Andrade
publicado por RAA às 11:24 | comentar | favorito
19
Set 11

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En art, il n'y a que deux choses essentielles: l'instinct et le don.


Vlaminck
publicado por RAA às 23:39 | comentar | favorito
19
Set 11

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A sedução está para a rendição
como a flor para o fruto.
(Quanta flor sem fruto!)

David Mourão-Ferreira
publicado por RAA às 22:58 | comentar | favorito