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A saudade vindoira espero-a, pois, agora

Que acho o presente em rosas brancas desfolhado,

Mais um ano, dois, três, e hoje será outrora

E todo este fulgor é a sombra do passado.

 

Chorarei, e não mais hei-de rever a aurora

Que surgiu dentro em mim como um sonho doirado.

Foi este o dia, em tal distante, em tal hora,

E revejo-me só, sem ninguém a meu lado.

 

Mas depois, uma nova ilusão erradia

Vem buscar-me no grande ermo em que estou: floresce

De novo o lírio azul na floresta sombria.

 

Um cisne, erguendo o colo ebúrneo, esbelto o porte

Virginal, exaltado ao céu, canta uma prece...

Pobre alma! o sonho foi-se, e afinal surge a morte.

 

A dor imaterial que magoa o teu riso,

Ténue, pairando à flor dos lábios, tão de leve,

Faz-me sempre pensar em tudo que é indeciso:

Luares, pores-de-sol, cousas que morrem breve.

 

Alphonso de Guimaraens,

publicado por RAA às 14:43 | comentar | favorito