17
Abr 12
17
Abr 12

ARTE POÉTICA

 Versos

Os que se escrevem com o pulso

Quando nos cortam a mão

...E só então...

Os que se datam com não-datas de calendário

Mas datas de mortes ou de partos;

O tempo que leva uma criança a nascer

Um cadáver a apodrecer

Não são tempos que admitam rótulo

De anos e mês e hora

Poesia

Só a da agonia

Que mata ou cria

Poemas

Só este

E os que escrevi e não escrevi quando morreste

 

António Neto

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15
Abr 12
15
Abr 12

AS GAVETAS

Não deves abrir as gavetas

fechadas: por alguma razão as trancaram,

e teres descoberto agora

a chave é um acaso que podes ignorar.

Dentro das gavetas sabes o que encontras:

mentiras. Muitas mentiras de papel,

fotografias, objectos.

Dentro das gavetas está a imperfeição,

a mágoa com que repetidamente te desiludes.

As gavetas foram sendo preenchidas

por gente tão fraca como tu

e foram fechadas por alguém mais sábio que tu.

Há um mês ou um século, não importa.

 

Pedro Mexia

publicado por RAA às 23:14 | comentar | favorito
12
Abr 12

OUTRA CANTIGA AINDA

Quem fala de eternidade

a respeito de beleza

desacerta por vontade

ou não sabe o que é certeza.

Tudo é belo quanto é belo

enquanto belo se vê,

como amanhã pode sê-lo

o que por ora não é.

É mais belo o céu profundo

ou o rasto de uma cobra?

Também às voltas do mundo

a eternidade se dobra.

 

Armindo Rodrigues

publicado por RAA às 16:47 | comentar | ver comentários (2) | favorito
12
Abr 12

NATUREZA MORTA COM MAÇÃS

É triste

o espectáculo do amor

apodrecendo aos poucos

na fruteira

as maçãs que te trouxe

têm agora a pele seca e enrugada.

 

Luís Filipe Parrado

publicado por RAA às 11:03 | comentar | favorito
11
Abr 12
11
Abr 12

CANCIÓN

Pasé un verano intero escuchando ese disco.

Para que la emoción no se le fuera

lo escuchaba una vez cada día.

Si me quedaba hambriento salía a caminar.

 

A su manera la luz cantaba esa canción,

la cantó el mar, la dijo

un pájaro.

Lo pensé en un momento:

todo me está pasando para que me enamore.

 

Luego se fue el verano.

El pájaro

más seco que la rama

no volvió a abrir el pico.

 

Antonio José Ponte

publicado por RAA às 17:26 | comentar | favorito
10
Abr 12

(BOXE)

No mini-ginásio do Sport Lisboa e Amoreiras

um rapazola gritou: poesia! poesia

é o cangalho das feiras, onde sempre

chega tarde a melodia!, a camisola

lançada pró tapete com sabor a sujo.

E no entanto, o braço era perfeito;

 

o ombro um tanto oblíquo merecia

o olho pardo do freguês vizinho.

A laranja, no sumo, é sábia pena

para o desejo ou fuga que meneia

cegos copos de vidro facetado

e a bandeira do clube de permeio.

 

A rima, sim, é esse vão ouvido

com que se atiram socos à parede;

um deus, seguramente, mas aflito

de não saber coas mãos, depois,

quando era fim de noite e já ninguém sabia

o que era corpo, sangue ou poesia.

 

António Franco Alexandre

publicado por RAA às 14:58 | comentar | favorito
10
Abr 12

A CAMÕES

Quando n'alma pesar de tua raça

a névoa da apagada e vil tristeza,

busque ela sempre a glória que não passa,

em teu poema de heroísmo e de beleza.

 

Gênio purificado na desgraça,

tu resumiste em ti toda a grandeza:

poeta e soldado... Em ti brilhou sem jaça

o amor da grande pátria portuguesa.

 

E enquanto o fero canto ecoar na mente

da estirpe que em perigos sublimados

plantou a cruz em cada continente,

 

não morrerá sem poetas nem soldados

a língua que cantaste rudemente

as armas e os barões assinalados.

 

Manuel Bandeira

publicado por RAA às 11:35 | comentar | favorito
09
Abr 12

"O abutre devora os mortos"

O abutre devora os mortos

sem ter culpas de assassino.

Come a garça peixe vivo

com ares de asceta divino.

 

poema sânscrito anónimo

 

(Jorge de Sena)

publicado por RAA às 14:34 | comentar | favorito
09
Abr 12

Transparências

autor: Vieira Calado
título: Transparências
prefácio: José Carlos Vilhena Mesquita
edição: AJEA - Edições
local: Faro
ano: 1999
págs.: 60
dimensões: 22,5x15x0,5 cm. (brochado)
capa: Deda
impressão: Grafistudios, Portimão
tiragem: 400 
obs.: dedicatória do Autor
publicado por RAA às 00:11 | comentar | favorito