NAVEGAÇÃO À VELA

Segue:

tens nas bússolas todos os nortes

e nos sextantes

as alturas de todas as estrelas,

que foram feitas só para te guiar.

 

Segue,

nos teus mapas

estão marcadas todas as loxodromias

e nos portos

os cais mansos

estendem-te os braços maternais.

 

Vai

pelo caminho seguro

na certeza de aportar.

Vai

nos vapores das companhias

com baleeiras nos decks

e S.O.S. nas telegrafias

e cintos de salvação.

 

Vai

pelo boulevard iluminado,

pelos caminhos traçados

pelas velhas caravanas

do tempos dos Ramsés...

 

Mas deixa

que eu arrisque a minha vida

nas encruzilhadas escuras

dos bairros criminais,

e vá só

pelos desertos

com simouns e miragens

fora das rotas fatais;

deixa

que eu viva a aventura

sem bússolas e sem astros

-- como nos contos da velha pirataria

que a mim próprio eu contava

nos meus tempos de menino

e em que eu mesmo era o herói

e herói sempre invencível --

que eu amo só

as tempestades bravas

que partem os lemes e os mastros

e rasgam as velas

(asas agonizando nos topos

entre tufões)

e as ondas

grandes como montanhas

que nos arrastam das estrelas aos abismos;

e as marés irresistíveis

que me encalham nos baixios...

Que eu amo só

a vida arriscada

numa espelunca esquecida

duma rua de Xangai

num duelo de facada.

 

Vai

pelos caminhos seguros

nos vapores das companhias

com certeza de aportar...

deixa

que eu continue sendo

o último tripulante

da fragata naufragada

neste mar dos tubarões.

 

Joaquim Namorado

publicado por RAA às 15:32 | comentar | favorito