POENTE
No postigo do «monte»
inquieto rosto acode
espreitando para longe
o descampado aberto.
(Quem vem lá na distância,
que nem a seara mexe
nem o pó se levanta
dos caminhos sem vento?...)
Manuel da Fonseca
No postigo do «monte»
inquieto rosto acode
espreitando para longe
o descampado aberto.
(Quem vem lá na distância,
que nem a seara mexe
nem o pó se levanta
dos caminhos sem vento?...)
Manuel da Fonseca
Escrevo, muita vez, molhando a pena
no amargo fel da minha própria dor,
versos gritantes em que ponho em cena
fantasmas de ilusões, versos sem cor.
De rubro e negro, pela dor absortos,
como notas vibrantes de clarim,
finda a batalha, abençoando os mortos,
são os versos que eu faço para mim.
Mas outros há, rebeldes como potros,
onde a graça anda imersa, estua e ri,
feitos prò mundo rir, neles, dos outros,
quando, afinal, neles se ri de si.
Outros, que mal escrevo e andam dispersos
na voz-cristal das moças do lugar,
incontestavelmente os melhores versos
que faço, porque neles sei pintar
verdes de esperança, azuis de céu da calma
que dentro em nós sorri,
rubros de coração, vermelhos de alma,
esses que mal escrevo e andam dispersos
na voz-cristal do povo,
são os versos
que eu faço para Ti!
Outubro de 1937
Álvaro Feijó
Após uma onda outra onda:
uma onda que se quebra
outra que se levanta...
Eterno e gasto
e sempre novo movimento das marés!
Joaquim Namorado
Fruto de sol na minha boca.
-- Terra tão vasta
e a vida tão pouca!
De Inverno e de Verão faça sol de Agosto.
-- Fruto na boca
deixou o seu gosto.
Assim deito meus olhos à flor do mundo.
Nem me peçam mais:
os lagos serenos têm menos fundo.
João José Cochofel
Canta, cantor esquecido, tuas valsas de angústia!
Aqui o canto de bar,
onde vêm parar os que serão suicidas,
gente de todas as nações falando todas as línguas,
emigrados de todos os países.
Aqui o canto de bar
onde ancorou o jogador arruinado
e as mulheres que perderam o número dos amantes
e os moços que sonharm vidas que não puderam ter.
Onde cantores esquecidos cantam valsas lentas e antigas
que trazem a recordação de lares despedaçados.
Onde vieram parar os maltrapilhos perdidos para sempre
e onde as valsas cantadas por vozes arrastadas,
que lembram multidões de coisas,
já não trazem a mínima saudade.
Aqui onde se sabe indiferentemente
que o homem saído há pouco
estendeu a corda e se enforcou na escada.
Aqui onde se joga tudo sem interesse
porque já não há nada para jogar.
É o canto soturno
onde não entra sol nem lua.
Janelas fechadas, só fumo e luz vermelha.,
mulheres de todas as raças de cabelos degrenhados.
Aqui o canto de bar
onde veio parar o lixo de todas as nações.
(Todos que estavam a mais nas cidades e nos lares...)
Canta, cantor esquecido, tuas valsas de angústia!
Mário Dionísio
É belo ver brincarem as crianças!
É belo ver cantarem as raparigas!
Esparzindo alegrias e esperanças,
Desfolhando os amores em cantigas!
É belo ver, em tardes vitoriosas,
Os poetas, os heróis, os combatentes,
Sob as chuvas das pétalas de rosas,
Sob aplausos contínuos e frementes!
É belo ver as mães enamoradas!
É belo ver os sábios entretidos!
Por milhares de seres adoradas!
Por milhares de seres benqueridos!
Mas o que há de mais íntimo e profundo,
E mais consola o coração humano,
Sim, o que há de mais belo! é, neste mundo,
Ver um punhal no peito de um tirano!
Martins Fontes