PAI
O pai quando ressona
é um tractor que lavra o sono
inquieto da casa que se abriu e fechou
para o receber ao fim da tarde
quando chega
de embrulhos nas mãos chaves sacos
de laranjas e jornais atrasados.
De mão na dobra do lençol
o pai promete acordar
para sair de novo ao amanhecer
porque a casa não lhe pertence
talvez a rua talvez um pedaço da rua
que lhe paga os passos e lhe reembolsa a liberdade.
O pai tem nas mãos o exemplo das mãos
e tem histórias da vida debaixo
das unhas cheias de óleo
com que lubrificou meus ossos em crescimento
me fez querer ser homem
dando-me daquelas mãos manchadas
machados
de enfrentar a coragem.
Ricardo Ferreira de Almeida
in Viola Delta, vol. XXX