NATUREZA MORTA
O amarelo bondoso
das maçãs
alastrava ao prato de faiança
por cima, o embaraço fálico
de duas bananas estrangeiras
ao lado, umas uvas tardias
escorregavam lassas
entre os dedos
uma nódoa negra
tinha tocado podre
uma descuidada e solitária pêra rocha
e coroando o prato
o riso eufórico
de cinco belíssimas laranjas!
Um ramo de hortelã
ainda verde
num púcaro transparente
perfumava o ar
Enquanto para lá do vidro da janela
o sol outonal, desprevenido
persistia em brilhar.
Ângela Leite, As Horas de Penélope