ÚLTIMO SONETO
Se me sobrevivesse, imperecida,
A memória da angústia que sofri
Na desordem do tempo em que vivi,
Já tinha fundamento a minha vida.
Debrucei-me na História, mas não vi
outra idade com esta parecida:
Tantos caminhos, tantos! e perdida,
A noção de chegar até aqui!
Árvore do passado! já não cabem
mais ilusões à sombra dos teus ramos...
E os teus frutos, agora, a nada sabem!
Poesia! onde me levas? onde vamos,
se as fórmulas antigas não nos abrem
O mistério da treva que sondamos!?
Carlos Queirós, Desaparecido (1935)