CANTO DE BAR

Canta, cantor esquecido, tuas valsas de angústia!

 

Aqui o canto de bar,

onde vêm parar os que serão suicidas,

gente de todas as nações falando todas as línguas,

emigrados de todos os países.

Aqui o canto de bar

onde ancorou o jogador arruinado

e as mulheres que perderam o número dos amantes

e os moços que sonharm vidas que não puderam ter.

Onde cantores esquecidos cantam valsas lentas e antigas

que trazem a recordação de lares despedaçados.

Onde vieram parar os maltrapilhos perdidos para sempre

e onde as valsas cantadas por vozes arrastadas,

que lembram multidões de coisas,

já não trazem a mínima saudade.

Aqui onde se sabe indiferentemente

que o homem saído há pouco

estendeu a corda e se enforcou na escada.

Aqui onde se joga tudo sem interesse

porque já não há nada para jogar.

É o canto soturno

onde não entra sol nem lua.

Janelas fechadas, só fumo e luz vermelha.,

mulheres de todas as raças de cabelos degrenhados.

Aqui o canto de bar

onde veio parar o lixo de todas as nações.

(Todos que estavam a mais nas cidades e nos lares...)

 

Canta, cantor esquecido, tuas valsas de angústia!

 

Mário Dionísio

publicado por RAA às 19:37 | comentar | favorito