CORO DOS CAÍDOS

Cantai bichos da treva e da aparência

Na absolvição por incontinência

Cantai cantai no pino do inferno

Em Janeiro ou em Maio é sempre cedo

Cantai cardumes da guerra e da agonia

Neste areal onde não nasce o dia

 

Cantai cantai melancolias serenas

Como trigo da moda nas verbenas

Cantai cantai guisos doidos dos sinos

Os vossos salmos de embalar meninos

Cantai bichos da treva e da opulência

A vossa vil e vã magnificência

 

Cantai os vossos tronos e impérios

Sobre os degredos sobre os cemitérios

Cantai cantai ó torpes madrugadas

As clavas os clarins e as espadas

Cantai nos matadouros nas trincheiras

As armas os pendões e as bandeiras

 

Cantai cantai que o ódio já não cansa

Com palavras de amor e de bonança

Dançai ó Parcas vossa negra festa

Sobre a planície em redor que o ar empesta

Cantai ó corvos pela noite fora

Neste areal onde não nasce a aurora

 

José Afonso 

publicado por RAA às 13:57 | comentar | favorito