19
Nov 10

PRECE

A máscara ri ou chora,
O ser olha, e impassível,
Deixa cair sobre tudo
Um olhar que diz:
Não importa.

Olhos de aflição
Querem fingir um sorriso,
Calar ao menos a mágoa
Não aflijam alguém...
O ser olha, e só murmura:
Não importa.

A quem, amigo, me abraça,
A quem, inimigo, me fere,
O ser distante contempla:
Não importa!

Senhor!
Dai ao meu ser interesse,
Por grandes, pequenas misérias,
Da minha vida real!
Dai-lhe o ódio, amor, piedade,
Crueza, ternura -- vida!
Não deixeis que eu assim viva,
Tendo em mim um indiferente
De tudo sempre distante!

Adolfo Casais Monteiro 
publicado por RAA às 16:06 | comentar | favorito
12
Out 10

POETA

Poeta: uma criança em face do papel.
Poema: os jogos inocentes,
invenções de menino aborrecido e só.
A pena joga com palavras ocas,
atira-as ao ar a ver se ganha ao jogo.
Os dados caem: são o poema. Ganhou.

Adolfo Casais Monteiro
publicado por RAA às 23:57 | comentar | favorito
27
Mai 10

TERRA MORTA

Um canto áspero, sem perfume,
Pela noite fora vem.
Vozes neutras e sem lume,
Nem amor têm.


Um canto álgido e soturno,
Canto de morte,
Vem como um vento contra as janelas,
Vento de noite de tempestade
Contra as janelas da nossa vida.


Como asas longas de morcegos
Lá fora a noite perpassa
Grandes mãos frias sobre as coisas


Adolfo Casais Monteiro
publicado por RAA às 12:37 | comentar | favorito