O mundo acabará quando não formos nós
o mundo: tudo existe
somente no olhar; gente passa
diante da esplanada no final de
julho quando ainda
os pulmões do verão inspiram o vapor
espesso do corpo como de alma um resíduo
e expiram o ar que seca o espírito:
este rodar de
gente e de estações
iludindo o sentido a que acedemos
devagar, tarde para
o conhecimento que poderia ter-nos
mudado a vida; prosseguimos
sem crença nessa via
olhando os corpos, sobretudo os
nossos plural que guarda
a dúvida de que a
extinção do corpo nos atinja
sozinhos, o mundo somos nós
di-lo a poesia recordando
os sentidos quando o mundo
perdiam, ou julgamos agora
que perdiam o que rapidamente
atravessava o desejo do dia: nada
o extingue, o desejo de que o fogo
a exacta metáfora seria, porém
não vou usá-la apagarei os
versos como um dia
os irá apagar o mundo reduzido
à minha consciência já vazia
Gastão Cruz,
A Moeda do Tempo (2006) /
/ O Escritor #22 (2007)