20
Jul 11

A MORTE

A alma escala as montanhas do frio e vai
abandonando o corpo,
do qual foi chama;
quando atinge o cume
contempla um céu sereno, benigno
onde se irá acolher;

ou navega junto ao círculo polar
até chegar a uma baía
de água límpida e quente?

Na escuridão da caverna
um medo vigia os nossos actos,
medo de que a vida seja apenas isto --
sombras projectadas na parede,
dor pelos caminhos,
até findar um dia, no sem sentido
de um corpo perecível.

Necessidade de saber, derradeiro
e redentor o desejo
ao acender no peito a ilusão
da vitória da vida
sobre o nada.

Na inútil função consoladora da poesia.

Jorge Gomes Miranda
publicado por RAA às 22:58 | comentar | ver comentários (2) | favorito
12
Out 10

DESAPARECIMENTO

Tudo caminha para o desaparecimento:
o homem que no seu tempo de vida
padece da árdua pergunta do corpo;
os indefesos animais devorados
em clausura pela sombra;
as nuvens no vórtice insano do vento;
a luz arrebatada à sombra e para ela
voltando no final;
o amor diante do rio do esquecimento.

Apenas o que carece de forma,
por de todas ser o molde,
é fonte de onde mana o conhecimento
misterioso do mundo:
em horas difíceis o que amamos
nele procura instantes de trégua,
refúgio de tenebrosa tempestade.

A esse, mais desconhecido do que a morte,
me dirijo, na inútil liturgia do poema,
para que te possa ungir as feridas do corpo
e te proteja na última morada da alma.

Jorge Gomes Miranda
publicado por RAA às 20:35 | comentar | favorito