E a nossa casa, Mãe
nosso lar de velhas paredes de caniço
já não está lá
no lugar onde o pai do pai do teu pai
ao sol e à chuva
em doze luas de trabalho
a construiu.
E no sítio da sua sepultura, Mãe
debaixo das mafurreiras de frutos de ouro
onde a bebida fermentava a missa de cocuana Matsinhe
pesam os muros de cimento
que o senhor das terras levantou
ao abrigo da lei da concessão de terrenos vagos
onde não existe ninguém
e só vivem negros
mulatinhos e negras.
Dentro das coordenadas geográficas
registadas numa planta do cadastro da circunscrição
dormes o teu sono perpétuo, Mãe
ao som das blasfémias que não chegaste a ouvir
mas gostarias de ouvir também contra eles
e querias também sentir contra eles minha Mãe.
E hoje que a nossa casa de paredes de caniço
e os trinta e cinco pés de mandioca
foram esmagados pelas lagartas de aço
do monstro Caterpillar do senhor concessionário
o secular desespero
planta milho que não nasce
e mapira que não cresce mas dói
na latitude zero do talhão de pedras e cobras
da reserva indígena onde moram blasfemos
nós o negros, os mulatinhos
e as negras.
José Craveirinha